18.9.07

A política é como a química



Lembro de uma palestra com a assessora de comunicação da Basf, que contava sobre o case da empresa, que precisou de um suado plano estratégico integrado de comunicação para tirar o rótulo de “química é podre” do senso comum, algo que, nas vésperas da virada do milênio estava muito à tona. A onda do natureba, light, o boom de programas de Responsabilidade Ambiental e Social nas organizações e assim por diante, cegava os mais simplistas e parecia que a química não estava inserida no mundo e era coisa de um passado bárbaro. Como se química se reduzisse a processos grosseiros de fabrico e fosse quase sinônimo de soda cáustica.

Com um planejamento bem elaborado, a Basf refez seu slogan e com “A Química da Vida” investiu em espaços publicitários em todos os cantos e logo todos eram persuadidos de que a química está por toda parte e não é uma vilã do mundo moderno, ao contrário, faz parte da vida das pessoas.
Lembrei disso ontem de manhãzinha ouvindo a Jovem Pan sobre o caso Renan Calheiros (amanhã tem votação do segundo processo, vamos ver o que vai dar).

Na semana passada, Renan foi absolvido pelo plenário do Senado, em sessão secreta, no processo que pedia a cassação de seu mandato. Apesar de ser acusado de usar recursos da empreiteira Mendes Júnior para pagar aluguel e pensão à jornalista Mônica Veloso, com quem tem uma filha fora do casamento, o cara continua lá. O fato colocou o “ahhhhhhh não é possível!” na boca de muita gente e os poucos exemplares de uma imprensa crítica remanescente de outros carnavais noticiou que “o plenário tomou uma decisão contra a vontade do povo”. E foi aí que pensei: mas que vontade é essa que deixa tudo passar?

Como a Basf fez, alguém, alguma coisa, de alguma forma deveria mostrar pro povo que a política não é um bicho de sete cabeças, como a química, permeia nosso cotidiano. Nós votamos, pagamos impostos e temos informações (pelo menos parte delas, que a mídia noticia) sobre o que acontece no topo da política e parece que é só isso. Mas não. Não mesmo. Há política no ambiente de trabalho, na relação com os vizinhos, na escolha do presente que vamos comprar em conjunto para um membro da família, na hora que defendemos que X bar que queremos ir é mais interessante. Até em alguns “bons dias” há política. Mas o povo não a sente por perto, parece que ela está muito longe de seu alcance, que a política pública "não é pro seu bico".

Alguns idealistas e outros seres pequenos demais no seu entendimento de como funcionam as coisas acreditam que a corrupção acabe quando X ou Y partido ou presidente assumir o poder, mas todos têm interesses próprios, todos têm sua política e imaginar que basta colocar os problemas nas mãos de um milagreiro e cair no samba é o caminho, é um erro. Se a maioria que vota vê aquela ação como um “ok” momentâneo na urna eletrônica (supermoderninha, por sinal), aquele dia que ninguém pode beber e passa horas procurando pelo título escondido em alguma pastinha ou gaveta não tem sentido. Num país onde as pessoas não vivem, passam pela democracia, a liberdade de escolha é um presente de grego.


p.s.: não escrevi isso criticando o governo atual ou o anterior, ou um partido ou outro. O que irrita é a postura do brasileiro e me incluo nisso de certa forma.

Um comentário:

Anônimo disse...

sensato, Thais. E quando temos a liberdade de escolha acabamos trocando os pés pelos antebraços. Não só na hora de eleger antigos caciques políticos e ideologias atrasadas, mas em situações mais próximas que interferem diretamente em nosso cotidiano. Foi o que aconteceu com o plebiscito do desarmamento, quando a população, a mesma que reclama de vivermos num país inseguro, votou no direito de portar uma arma como solução. Triste.