30.7.09

Elas



Anuviada, essa é uma boa palavra para ela. Tem dificuldades em se concentrar, pois tudo tem seu devido interesse e valor, aí fica difícil não dar atenção a tudo. Fala bastante, pensa bastante, se emociona a cada novo detalhe que lhe passa à frente. Se não precisasse trabalhar, certamente seria uma dondoca loira e maquiada, que passaria horas e horas fazendo o bem com ações de serviço voluntário em prol dos animais gente e dos bichos. Sairia em revistas de fofoca como a dondoca mais loira e louca já encontrada. O Fantástico faria uma reportagem sobre ela, Caras a convidaria para um fim de semana no castelo.

Morena, alta, olhos marcados. “As mulheres da minha família têm essas rugas bem marcadas”, diz. O detalhe é fato, mas não é por isso que ela fica menos bonita. Tem personalidade forte, alguns acham que até uma certa grosseria involuntária, mas a risada sincera quebra a primeira impressão quando desencadeia outros muitos risos. Não coloca florzinhas ao redor da vida. Tem pé no chão e não derrete em qualquer chuvinha. É mulher com m maiúsculo, ops, Mulher.

Não sabe se é a coloração loira ou é ruiva que lhe cai melhor. Fica bem com ambas. Já foi taxada de reprimida, bandida, boazinha, mázinha, boba, espertinha. De fato, ninguém a conhece bem, é misteriosa e do tipo ‘come quieto’. Chora pensando nas criancinhas que podem pegar gripe e nos animais que têm de se esconder da chuva por não terem um teto. Ri e torce pros espertões tropeçarem e se igualarem aos pequenos. Teve um grande amor e não disse a ele, espera por um novo, enquanto sai, bebe, corre, dorme, trabalha, cansa e começa de novo.

Séria, disciplinada, compromissada e bom coração. Todos os dias chega no trabalho com os cabelos molhados e dá bom dia com a vivacidade de quem lavou também a alma além do corpo. Não é de muitas palavras no dia-a-dia, mas tem sempre palavras certas quando precisa. Às vezes doces, outras duras, algumas frias, outras calorosas. Seus mistérios não representam perigo e sabe fazer com que as pessoas percebam isso. Mantém o queixo erguido e a coluna ereta enquanto digita seu trabalho em frente ao monitor.

Só sabe que consegue ser feliz mesmo nos dias tristes. Não é difícil perceber quando acorda com mais brilho e vontade de terminar o dia com chave de ouro, nesses dias está com os cabelos arrumados e um acessório chamativo. Gosta de reconhecer o valor das pessoas, gosta de se dar bem com o mundo, gosta de olhar o mundo por uma janela mais colorida. Talvez por querer a reciprocidade, talvez por vislumbrar isso como sua meta de felicidade. Tolera alguns desaforos, mas nunca a injustiça e não tem personagens para cada situação. É uma só, com suas rugas firmes na testa.

Trabalharam das 8h às 21h e foram para um bar. Todas beberam cerveja, todas comeram peixe com molho Rochefort, todas riram e todas correram quando uma briga movimentou o ambiente. Todas foram e voltaram juntas e todas dividiram confidências pessoais. Todas reclamaram como mulherzinhas, ou pelos quilos a mais, ou pelas rugas, ou pelas desilusões, ou pelo frio que fazia, ou pela hipocrisia. Todas estão ali e é por isso que, com todas as diferenças de cada uma, elas são elas em harmonia.

22.7.09

Pessoas anônimas


Acorda cedo, o sol ainda nem despertou e só o galo do quintal do vizinho de trás da sua casa canta meio desmilingüido. Um galo desmilingüido morando na periferia da cidade que levanta poeira asfáltica 24h por dia. Toma banho, faz a barba debaixo do chuveiro, se enxuga com a toalha felpuda azul marinho, coloca o jeans surrado, o jaleco com o emblema “da firma” e calça as botas de segurança. Abraça a esposa que acabara de passar o café, toma um pingado, acaba com um pão na chapa em quatro mordidas e corre para o ponto de ônibus. Sentado próximo aos assentos reservados para idosos e gestantes, repara em um senhor bastante enrugado, com mãos grosseiras e unhas escuras. Imagina se foi ou ainda era um mecânico ou quem sabe um engraxate, talvez um funcionários do departamento de obras da prefeitura. O ônibus pára no ponto de decida. Mais um dia de trabalho. Das 7h às 17h ele é mais um.


Toda quinta-feira ela acorda mais cedo para chegar antes e encontrar os produtos mais bonitos nas bancas. Toma café preto com bolacha maizena e corre pra feira. Deixa um espaço para o pastel de carne, delicioso e quentinho, que combinava tanto com turbaína, mas o médico proibiu por causa da diabetes. Anda ligeira na rua ainda de paralelepípedos, esquecendo até do reumatismo que vem chegando. Quinta-feira é um dia feliz. Em meio ao colorido da feira ela esquece da sua vida cinza desbotado. Em meio aos gritos dos feirantes ela esquece do silêncio amedrontador da sua casa. Encontra uma ou outra amiga dos tempos antigos de escola, todas com batons avermelhados e lenços estampados no pescoço ou na cabeça. Ela se diverte com isso! Sempre foi discreta e por isso ostenta um casaquinho preto ou marrom castor às quintas-feiras, sempre com um broche enfeitando. Acaba saindo apenas na hora da chepa. A quinta-feira acaba com restos de cores e cheiros misturados de frutas, legumes e verduras que não foram escolhidos. É uma cena triste, mas fica confortada. Todos as quintas-feiras vê o brilho e o fim da festa e não se sente tão diferente. “É o curso das coisas”, pensa no caminho de volta para casa, caminho lento, com o carrinho cheio de companhia até a próxima quinta.


Tudo é muito alto para elas, nada podem alcançar. Correm, sobem no sofá, tentam fazer o mesmo na cadeira da cozinha, mas é difícil! A mãe lava roupa e fala ao telefone enquanto brincam na sala. Ainda não podem acender a luz sozinhas, o interruptor é alto demais. Ainda não podem olhar pela janela e ver o que faz tanto barulho lá fora, a janela é alta demais. Ainda não podem atender à porta quando alguém toca a campainha, a maçaneta é alta demais e é necessária força para girá-la. Agarram ursos de pelúcia, vêem TV, montam castelinhos com peças de madeira, tiram os sapatos para a mãe ter que colocá-los novamente. Brigam, puxam os cabelos uma da outra, brincam de boneca, rabiscam folhas de rascunho com lápis de cor. Almoçam quase sozinhas, "parecem duas mocinhas!", a mãe elogia, segurando ainda colheres tortas. À tarde, quando ela vai trabalhar, recebem beijos e carinhos até que a avó chega para contar estórias e fazê-las dormir. A abraçam, disputam o colo. Mas tudo ainda é alto demais, alto demais para saberem o que virá pela frente.

20.7.09

Sem passar vontade

Quando a mestre de cerimônias sinalizou aos 200 convidados que o café estava aberto e as pessoas olhavam com água na boca para croissants e carolinas de maracujá cobertas com chocolate, ele pegou o microfone e começou a falar tonterias e meter o pau no serviço de água e esgoto. Quem estava próximo à mesa cheia de guloseimas recuou por educação, mas era difícil prestar atenção naquele discurso em hora inapropriada. Ele tinha quase 80 anos e este comportamento era sua marca registrada. Uns riam, outros cochichavam, poucos fingiam prestar atenção e todos queriam que ele parasse logo. Dois dias depois faleceu sem ter passado vontade de "fazer o uso da palavra", como disse na ocasião. E das 200 pessoas que estavam no evento, algumas que se encontraram comentavam, "ele nunca passou vontade". A viúva comentou "meu marido nunca passou vontade". A neta disse "vovô fazia tudo o que tinha vontade". Parece que morreu feliz.

17.7.09

Viajando...


Uma das metáforas mais bacanas para a vida a dois é o mergulhar. E, para mim, cabe mais que perfeitamente, pois tenho uma capacidade infantil de viajar e imaginar várias correspondências. Olha só, um bom mergulhador sabe que nunca deve mergulhar sozinho. Não é prudente. Por mais que saibamos desalagar a máscara e até seguir com a visão turva sem ela; por mais que saibamos de diversas formas recuperar o regulador, alcançar o octopus, fazer subida de emergência boiada, ser prudente ao passar próximo a tocas de moréias (rs), nadar estilo frog com perfeição, controlar a ansiedade e planejar o mergulho com base em técnica e segurança, enfim, por mais que sejamos mergulhadores Arraso... descer sem “um dupla” (é ‘um’ mesmo e não ‘uma’ dupla, na 'linguagem de mergulhador') não é legal. Não é tão bom, não é tão seguro, não é recomendável. Para mergulhar é preciso pelo menos dois. E viver não é assim?

Não aquele que passeia pela vida, mas aquele que realmente mergulha na vida consegue apreciá-la e se sentir confortavelmente seguro 100% do tempo, se não tiver um dupla? Tá, há fases em que o esporte que mais cabe é o surf, mas é uma fase passageira, praticamente adolescente. Mergulhar não, mergulhar é maduro. E é aí que vale dizer que o mais bacana é que as duplas de mergulhadores nunca se completam. São pessoas inteiras que estão juntas, uma zelando pela vida da outra. Há equipamentos e reservas para os dois... ao passear no mar, a pressão é enorme e não é possível se desconcentrar, mas é natural e conseqüênte nos deixamos levar e abstrair nossa forma condicionada de respirar em terra, nos locomover, nos comunicar. E mergulhar na vida não é assim? Quem passeia na vida faz tudo como sempre faz, mas quem mergulha tem o privilégio de abstrair o comum e viver algo diferente, profundamente diferente.

Há muito mais o que viajar neste assunto, mas não vou continuar. O tema veio em mente porque sonhei com isso esta noite. Sonhei que estava em Cozumel, para onde provavelmente iria no Ano Novo se eu ainda tivesse um dupla. Poderia até me programar para ir e encontrar um dupla qualquer lá, mas até lá muita coisa pode acontecer. É cedo para planos. Vai que algum doido me chame em novembro para ir pra Argentina?! Nada mais romântico que pegar gripe suína a dois no reveillon, rs. Taí, dispenso um beijo sob a Torre Eiffel!. Um amigo perguntou “o que você vai fazer no reveillon?! Acho cedo, mas vou mergulhar e pensar nisso.

- Olha eu na foto, inteira, mas sem dupla. Esse dia bebi água salgada. A válvula do regulador estava com problemas, algo dificílimo de acontecer. Quando fui pegar o octopus, devo ter perdido o controle, pois ele parecia superpreso (nunca está, é fácil puxá-lo) e machuquei um dedo. Que dor! Quase fico sem uma unha... mergulhar sozinho dá nisso.

Sexta, dia de rímel a prova d´água


"Já aprendi a levantar de muitos tombos diferentes, aprendi a dar com a cara na porta e continuar andando, aprendi a sonhar, a chorar quando os sonhos se desfazem e que pra isso existe rímel a prova d’água e corretivo."

Esse trecho do texto da Mari, que você pode conferir aqui, é muito minha cara. E hoje é sexta, por isso, vambóra!!!!!! A excursão sai cedo, umas 19h... vamos?!

15.7.09

Novo sonho-brega-pop-star

Durante muitos anos, meu sonho-brega-pop-star era participar (como primeira voz, claro) do clip da música tema do Moulin Rouge, "Lady Marmalade". Estaria lá, com aquele figurino espetaculoso fazendo caras e bocas, rs. Mas, há pouco descobri uma música bacaninha, assistindo ao trailler do filme "A Proposta", bobinho, mas bem legal (assisti no feriado). Procurei o clip e logo surgiu a vontade de abandonar a idéia do Moulin Rouge. Trata-se da "Hot and Cold", da Katy Perry. A parte da coreografia no barracão om algo que parece um bonecão de posto amarelo é muito 10, rs. Tá, não é um suuuuperrrrr som, mas é legal demais! E eu queria participar do clip! A tradução é bem cotidiana, ou seja, muita gente se identifica. Taí meu novo sonho-brega-pop-star-bem-pop...

Katy Perry - Hot N'Cold - Music Video


Hot N' Cold
Katy Perry

Composição: Katy Perry / Dr. Luke / Max Martin
You change your mind
Like a girl changes clothes
Yeah you, PMS
Like a bitch
I would know

And you over think
Always speak
Cryptcally

I should know
That you're no good for me

Cause you're hot then you're cold
You're yes then you're no
You're in and you're out
You're up and you're down

You're wrong when it's right
It's black and it's white
We fight, we break up
We kiss, we make up

(you)You don't really want to stay, no
(woooo)But you don't really want to go-o

You're hot then you're cold
You're yes then you're no
You're in and you're out
You're up and you're down

We used to be
Just like twins
So in sync
The same energy
Now's a dead battery
Used to laugh bout nothing
Now your plain boring

I should know that
You're not gonna change

Cause you're hot then you're cold
You're yes then you're no
You're in and you're out
You're up and you're down

You're wrong when it's right
It's black and it's white
We fight, we break up
We kiss, we make up

(you)You don't really want to stay, no
(woooo)But you don't really want to go-o

You're hot then you're cold
You're yes then you're no
You're in and you're out
You're up and you're down

Someone call the doctor
Got a case of a love bi-polar
Stuck on a roller coaster
Can't get off this ride

You change your mind
Like a girl changes clothes

Cause you're hot then you're cold
You're yes then you're no
You're in and you're out
You're up and you're down

You're wrong when it's right
It's black and it's white
We fight, we break up
We kiss, we make up

(you)You don't really want to stay, no
(woooo)But you don't really want to go-o

You're hot then you're cold
You're yes then you're no
You're in and you're out
You're up and you're down

A gente rala pra caramba, mas "si diverte"





(Final do Casamento Comunitário realizado na cidade... eram 78 buquês, mas não pegamos nenhum! rs)

13.7.09

Queria escrever algo para chegar ao seu coração



Queria escrever algo para você que saísse do coração
E fosse tão forte, tão vivo, tão verdadeiro
E tão sublime e tão surreal
Que você não resistisse.
Queria escrever algo para você que saísse do coração, como a primeira coisa que lhe escrevi à mão, em uma folha de caderno, cuja original não tenho, nem cópia. É só seu.

Queria escrever algo para você que saísse do coração
E fosse tão único, tão comovente, tão lindo
E tão ingênuo e tão nosso
Que fizesse o amor que um dia existiu renascer e voltar a ser. A existir, a inundar. A preencher cada poro do teu corpo e do meu corpo e nossos pulmões com o mesmo ar.

Queria escrever algo para você que saísse do coração
E fosse mais alto que o som do apito que dei para você soprar e eu te ouvir
(E foi por isso que eu dei, mas não falei)
Que conseguisse matar seus fantasmas, te atrair para mim e te encher de paz.

A paz que já nos invadiu e que hoje,
sem ela
não consigo escrever algo para você que saia do meu coração e alcance o seu.

12.7.09

Tijolo bigorna


Há cerca de um mês e meio estava caminhando descalça me sentindo a mais feliz das mulheres quando, de repente, um tijolo caiu no meu pé direito. Veio do nada. Um daqueles tijolos baianos, sabe? Com furos? Então... do nada um caiu no meu pé descalço. Vou te contar como foi.

Antes de o tijolo baiano cair no meu pé eu estava numa boa caminhando descalça. Feliz da vida. O dia nem estava tão perfeito para isso, confesso, mas tinha sol e calor e promessa do dia seguinte ser bem melhor. E eu deixei os sapatos guardados. Tinha um sorriso no rosto, cabelos balançando no ritmo do meu quadril pra lá e pra cá e a blusa de malha fina acompanhava o jogo. Olhava ao meu redor com charme e não via motivo de me virar para trás. Estava tudo ok, tudo lindo, um caminho aberto e cheio de paisagens boas para olhar. Foi aí que o tijolo veio com tudo. Parecia aquela bigorna que o Pica-Pau joga em cima de seus “inimigos” em quase todos os episódios, sabe?! O sujeito passa ao lado de um prédio e o Pica-Pau joga do alto a bigorda e acerta a cabeça do ser, que no geral vira uma “pizza” e o asfalto racha, visualizou?! Então... caiu um tijolo-bigorda no meu pé.

Óbvio que doeu demais! Meu pé virou pizza e o asfalto se rachou. Mas já se passou mais de um mês. Não tem como eu sair por aí correndo descalça, mas já dá pra eu caminhar. Ainda dói muito, ainda dá pra ver os pontos cirúrgicos, mas não preciso de cadeira de rodas. Se sinto falta do caminho ensolarado? Claro, né! Mas estou seguindo manquetola até que feliz pelas ruas nubladas pelas quais ando passando. Pelas ensolaradas vai demorar um pouco. Lá não se pode passear com sapatos e, com esse frio que faz aqui, só daqui um bom tempo. O estranho é que ando me divertindo mesmo assim. E muito!
Ufa, isso deve ser um bom sinal.


(Imagem perfeita para o post extraída de http://ryotiras.com)

10.7.09

“... e se estiver sem pára-quedas, a dor será breve”


Ela não acreditava que ele era capaz de assumir o leme, mas, bravamente, ele mostrou que ela estava errada. Ela gostou da demonstração de firmeza. Sentiu-se segura, entrou no barco e desmereceu o colete salva-vidas, ficou ensacado embaixo de todas as coisas mais úteis. O passeio foi incrível, belas paisagens, dias claros, outros escuros, mas todos agradáveis, até que ele sentiu um desconforto. E foi nesse dia, sem ela sequer imaginar, que ele a jogou no mar e seguiu sozinho. Ele com o leme no piloto automático, firme numa direção qualquer, ela no oceano à deriva. Ele sumiu no horizonte, ela está boiando até chegar em alguma praia. Com os braços e pernas abertas, deitada no mar ela olha pro alto. Olha pro céu e decide: “mar, nunca mais! Agora só quero voar...”

5.7.09

Lindo, triste, french.



ps.: Essas não são filhas dele, como o título no You Tube coloca. São concorrentes de um concurso x. Recebi do meu avô este vídeo e o achei lindo demais, assim como toda boa composição triste e francesa.

2.7.09

o sapato preto que não surpreendeu e o que surpreendeu


Ela sabia que não adiantava questionar, pois a resposta era simples: há várias opções, e ele não escolheu a mesma que a dela. Ok. Mas ela não conseguia ter as rédeas do pensamento nas mãos e o cérebro pensava demais. Foi assim que, de repente, entre mil pensamentos, lembrou de algo interessante: entre mil opções ele não escolheu nenhum, pois nenhum sapato preto o surpreendeu. E ela chegou a uma outra conclusão mais simples ainda: ele não achava ou não queria que ela fosse o sapato preto dele. Ironicamente havia encontrado um sapato preto que a surpreendeu, até titubeou com o preço, mas sabia que valia a pena. O problema é que, veja só... o sapato preto que a surpreendeu era ele e, agora, seria estranho calçá-lo. Deixou na caixa, na última prateleira da sapateira. Ai que pena, ele é tão especial. E agora vai ficar lá, porque ela só quer sapatos bemmmmmm coloridos.

mais uma vez à espera da primavera

Quando ele decidiu ir para o Alaska e ela não pôde ir junto, todo o resto do mundo ficou mais frio. Ela sabia que ele ficaria um tempo fora, mas que voltaria, mas os dias foram se passando, a primavera passou, o verão passou, o outono passou. Ela que só conseguia pensar nas coisas boas que ainda fariam juntos, agora pensava em quão distante cada desejo estava e a saudade foi se misturando à tristeza, e à tristeza, um pouco de revolta. Os beijos que poderiam ser trocados, os carinhos que poderiam ser doados, as risadas cúmplices que poderiam existir e as cobertas que poderiam não cobrir eram pensamentos que não faziam bem. Quando pela manhã saía de casa, fechava os olhos bem forte e depois os abria. Era assim que começava um dia após o outro e, com este piscar forte de olhos, colocava um ponto final nos pensamentos. A conta-gotas, esquecia um pouquinho de tudo que não foi compartilhado. Colocava um sorriso falso no rosto e caminhava, com alguns passos ele já não era tão falso assim. E esperava a primavera chegar mais uma vez.